30º Domingo do Tempo Comum

“Façam suas apostas”

Desde a antiguidade que os cambistas já exerciam seu ofício. E naquela semana estavam agitados.

Uma disputa de bigas inaugurava a nova pista de corridas, a maior construída em todo império. O primeiro corredor, altaneiro e muito seguro de si impunha um respeito único, o outro um pouco agitado e preocupado aparentava já a derrota. Os torcedores corriam para pegar um bom lugar.

Escolhendo os cavalos certos

Cada carro era puxados por dois cavalos. Em meio a batalha da velocidade o primeiro, já famoso, estava na dianteira, mas… de repente o adversário ultrapassou e no final ganhou a coroa de louros. Derrota humilhante para o campeão. Havia perdido a corrida para um amador. Qual foi a razão? Quem nos explica é São João Crisóstomo

O primeiro, tinha dois cavalos para puxar a sua biga, um chamava-se Virtude  e o outro Soberba. O segundo corredor também tinha dois cavalos, chamados, Pecado e Humildade.

Em meio a corrida o peso e a lentidão de Pecado são vencidas pelo poder de Humildade, com a qual está unido. O primeiro carro, a pesar do impulso de Virtude, se retarda e é vencido não pela debilidade de Virtude, mas pelo peso e a moleza opressora de Soberba.

30º Domingo

Esta disputa se passa todos os dias em nossas vidas e é o tema deste 30º Domingo do Tempo Comum. Mons. João Clá Dias, fundador e presidente dos Arautos do Evangelho nos presenteia neste Domingo com uma bela meditação sobre a forma de rezar.

 “Subiram dois homens ao Templo a fazer oração: um era fariseu e o outro publicano”.

Eis uma simples frase penetrada de substanciosos significados. À mesma hora e no mesmo empenho de rezar, sobem ao monte Moriah, onde se localiza o Templo, dois homens: um fariseu e um publicano. Segundo o juízo humano, o fariseu é justo, cheio de virtude e piedoso, e certamente irá proferir uma excelente prece. O outro, pelo contrário, pecador tão desprezível, não conseguirá senão atrair sobre si o escândalo de todos e a cólera do próprio Deus.

 “O fariseu, de pé, orava no seu interior desta forma: ‘Graças Te dou, ó Deus porque não sou como os outros homens, ladrões, injustos, adúlteros; nem como este publicano. Jejuo duas vezes por semana e pago o dízimo de tudo o que possuo’”.

“Graças Te dou…”. Nada melhor do que dar graças a Deus. É piedoso e meritório, mas essa impostação de espírito deve proceder da consideração de nosso nada, de um vigoroso sentimento de nossas fraquezas e misérias, como também da adoração a Deus por sua infinita misericórdia, não só suspendendo os castigos que nos seriam devidos, mas muito pelo contrário, cumulando-nos de dons e graças.

Não é, porém, essa a ação de graças do fariseu; ele se exalta a si próprio e insulta todos os outros. “Procura o que é que ele pede a Deus em suas palavras, e não descobrirás. Subiu ao Templo para orar e não quis rogar a Deus, mas sim louvar-se a si mesmo. Triste coisa é louvar-se em vez de rogar a Deus; além disso, acrescenta o menosprezo àquele que orava”. “Com isso, abriu pelo orgulho a cidade do seu coração aos inimigos que a sitiavam, a qual ele inutilmente fechara pela oração e pelo jejum: são inúteis todas as fortificações quando nelas há uma brecha por onde pode entrar o inimigo”.

“O publicano, porém, conservando-se à distância, não ousava nem sequer levantar os olhos ao céu, mas batia no peito dizendo: ‘Meu Deus, tende piedade de mim, pecador’”.

No publicano, tudo é humildade, contrição e pedido de clemência. Usando de um costume que já não se vê mais nas Igrejas, batia no peito sem respeito humano. Contrariamente às “modas piedosas” de hoje, nada de leviandade de espírito, de dissipação ou de perpétua agitação; falava a Deus.

Muitos exemplos nos dá o publicano, inclusive no que tange à substância de seu pedido: “Meu Deus, tende piedade de mim que sou pecador”.

“Digo-vos que este voltou justificado para sua casa e o outro não; porque quem se exalta será humilhado e quem se humilha será exaltado”.

“Na hora de entrar no Templo, os dois personagens, embora pertencendo a categorias religiosas e sociais diferentes, eram, no fundo, muito semelhantes. Na hora de sair, são radicalmente diferentes. Um estava ‘justificado’, ou seja, era justo, perdoado, estava em paz com Deus, tinha sido renovado. O outro permaneceu como era no início; mais ainda, talvez tenha piorado sua posição perante Deus. Um obteve a salvação, o outro não”.

Fixemos bem nossa atenção: trata-se aqui de uma sentença proferida pelo infalível e soberano Juiz, o próprio Filho de Deus, não poucas vezes diferente da dos homens. Se, sem as luzes da graça fôssemos chamados a escolher um dos Apóstolos para se tornar o primeiro dos Pontífices da Santa Igreja, não seria exagerado imaginar que a uns julgaríamos pretensiosos, a outros, pouco ativos, ao próprio Pedro, exagerado e imprudente. Quiçá, antes de se tornar traidor, não teríamos escolhido a Judas pela sua grande discrição, segurança e habilidade em finanças, tanto mais que ele chegou a criticar Madalena pelo desperdício de dinheiro em perfumes para o Mestre, quando havia, então, muitos pobres e necessitados. Por aí nos damos conta do que seria da própria Igreja se não fosse o Espírito Santo a dirigi-la; e do que será de nós se não nos submetermos às suas inspirações.

A Liturgia de hoje bem pode nos ser útil para um proveitoso exame de consciência: até onde somos humildes como o publicano? Ou haverá em nossas almas, alguma fímbria do espírito farisaico? Qualquer que seja o resultado desse exame, lembremo-nos de que: “A humildade levou ao Céu um ladrão, antes dos Apóstolos. Ora, se unida aos crimes ela é capaz de tanto, qual não seria seu poder se estivesse unida à justiça? E se a soberba é capaz de quebrar a justiça, o que não conseguirá caso se alie ao pecado?”

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Obras Consultadas:
DIAS, João S. Clá, O Inédito sobre os Evangelho, Libreria Editrice Vaticana
Città del Vaticano, 2012, pag 401 – 413
ORIA, Mons. Angel Herrera, VERBUM VITAE – La Palavra de Cristo, Vol VI, BAC, Madrid, 1954