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Solenidade de Cristo Rei do Universo

O ano litúrgico chega ao seu final.
Passamos pelo Advento onde ouvimos: “Eis que o Rei há de vir, Senhor da terra, ele mesmo de nós afastará o jugo de nosso cativeiro” (aclamação ao Evangelho da 2ª feira da Segunda semana do Advento). Logo depois, nas alegrias do Natal a Igreja cantou na vigília da noite santa: “Nasceu para nós um menino, um filho dos foi dado. Ele trás nos ombros as insígnias da realeza”. Na epifania a pergunta dos reis magos ecoou em nossos corações: “Onde está o Rei dos judeus que nasceu?” (Mt 2,2).
Durante a paixão, no Domingo de Ramos a liturgia cantou: “Glória, louvor, honra a ti, ó Cristo Rei, redentor”. Finalmente no tempo pascal pudemos contemplar o Rei da eterna glória que subindo aos céus sentou-se em seu trono, a direita do Pai.
Após todos estes dias a Solenidade de Cristo Rei encerra o ano litúrgico e dá a nota final da realeza de Nosso Senhor. Tal solenidade foi instituída em 1925 pelo Papa Pio XI com a encíclica Quas Primas.
Comentando tal data, Pio XII assim se expressou: “No começo do caminho que conduz à indigência espiritual dos tempos presentes, estão os nefastos esforços de não poucos de destronar a Cristo, o afastamento da lei da verdade que Ele anunciou, da lei do amor, alento vital de seu Reino. O reconhecimento dos direitos reais de Cristo e a volta a lei de sua verdade e de seu amor são a única via de salvação!” (Encíclica Summi Pontificatus).

No sexto volume da coleção “O inédito sobre os Evangelhos” de Mons. João Clá Dias, Fundador e presidente geral dos Arautos do Evangelho, o autor abre diante de nós o verdadeiro significado da realeza do Rei dos reis e Senhor dos senhores.

I – Rei no tempo e na eternidade

Ao ouvirmos este Evangelho da Paixão, de imediato surge em nosso interior uma certa perplexidade: por que a Liturgia, para celebrar uma festa tão grandiosa como a de Cristo Rei, terá escolhido um texto todo ele feito de humilhação, blasfêmia e dor?

Apesar de as exterioridades nos causarem uma impressão enganosa, Ele é o Senhor Supremo de todos os seres criados e até dos criáveis. Porém, diante de Pilatos, assevera: “O meu Reino não é deste mundo” (Jo 18, 36), porque não quer manifestar seu império em todas as suas proporções, a não ser por ocasião do Juízo Final.

Assim, enquanto o Evangelho nos fala de seu Reinado terreno, a Epístola proclama o triunfo de sua glória eterna. No tempo, vemo-Lo exangue, pregado na Cruz entre dois ladrões. A Liturgia exige de nós um esforço de fé para, indo além do fracasso e da humilhação, crermos na grandiosidade do Reino de Jesus.


II – A realeza absoluta de Cristo

Rei por direito de herança: Ele é o unigênito Filho de Deus e por Este foi constituído como herdeiro universal, recebendo o poder sobre toda a criação, no mesmo dia em que foi engendrado (cf. Hb 1, 2-5).
Rei por ser Homem-Deus: Por outro lado, Jesus Cristo é Deus e, assim sendo, tudo foi feito por ele, o Criador de todas as coisas visíveis e invisíveis. Aí está um Governo incomparável, superior a qualquer imaginação, e do qual ninguém ou nada poderá se subtrair.
O título de Rei Lhe cabe mais apropriadamente do que às outras duas Pessoas da Trindade Santíssima. De fato, o título de Rei, quando aplicado ao Pai, é usado de forma alegórica para indicar seu domínio supremo. E se quisermos atribuí-lo ao Espírito Santo, faltará exatidão jurídica, por tratar-se Ele de Deus não encarnado, pois, para ser Rei dos homens é indispensável ser homem. Deus não encarnado é Senhor, Deus feito homem é o Rei.
Rei por direito de conquista: Jesus Cristo é nosso Rei também por direito de conquista, por nos ter resgatado da escravidão a satanás. Ao adquirirmos um objeto às custas de nosso dinheiro, ele nos pertence por direito. Mais ainda se o obtivermos através de duras penas, pelos esforços de nosso trabalho, e muito mais, se for conseguido pelo alto preço de nosso sangue. E não fomos nós comprados pelo trabalho, sofrimentos e pela própria morte de Nosso Senhor Jesus Cristo? É São Paulo quem nos assevera: “Porque fostes comprados por um grande preço!” (I Cor 6, 20).
Rei por aclamação: Cristo é nosso Rei por aclamação. Antes mesmo das purificadoras águas do Batismo serem derramadas sobre nossa cabeça, nós O elegemos para ser o regente de nossos corações e de nossas almas, através dos lábios de nossos padrinhos. Por ocasião da Crisma e a cada Páscoa, de viva voz nós renovamos essa eleição, sempre de um modo solene.
Rei do interior dos homens e de todas as exterioridades: Não houve, nem jamais haverá um só monarca dotado da capacidade de governar o interior dos homens, além de bem conduzi-los na harmonia de suas relações sociais, seus empreendimentos, etc. O único Rei pleníssimo de todos os poderes é Cristo Jesus.

Exteriormente, pelo seu insuperável e arrebatador exemplo — além de suas máximas, revelações e conselhos — Ele governa os povos de todos os tempos, tendo marcado profundamente a História com sua Vida, Paixão, Morte e Ressurreição. Por meio do Evangelho e sobretudo ao erigir a Santa Igreja, Mestra infalível da verdade teológica e moral, Jesus perpetua até o fim dos tempos o imorredouro tesouro doutrinário da fé.

Aqui precisamente se encontra o principal de seu governo neste mundo: o Reino sobrenatural que é realizado, na sua essência, através da graça e da santidade.

O Reinado de Cristo, em nosso interior, se estabelece pela participação na vida de Jesus Cristo. É através da graça que nossa alma se transforma num verdadeiro trono e, ao mesmo tempo, cetro de Nosso Senhor Jesus Cristo.

E qual o principal adversário contra esse Reino de Cristo sobre as almas? O pecado! Por isso mesmo, se alguém tem a desgraça de cometê-lo, nada fará de melhor do que procurar um confessionário e com arrependimento ali declará-lo a fim de ver-se livre da inimizade de Deus. É impossível gozar de alegria com a consciência atravessada pelo aguilhão de uma culpa. Nessa consciência não reinará Cristo; e se ela não se reconciliar com Deus, aqui na Terra, tampouco reinará com Ele na glória eterna.

IV – Se Cristo é Rei, Maria é Rainha

O Verbo assumiu de Maria Santíssima nossa humanidade, e assim adquiriu a condição jurídica necessária para ser chamado Rei, com toda a propriedade. Foi também nesse mesmo ato que Nossa Senhora passou a ser Rainha. Uma só solenidade nos trouxe um Rei e uma Rainha.

V – Conclusão

Tenhamos sempre bem presente que só pelos méritos infinitos da Paixão de Cristo e auxiliados pela poderosa mediação da Santíssima Virgem nos tornaremos dignos de entrar no Reino. Seguindo os passos da conversão final do bom ladrão, poderemos esperar com confiança ouvir um dia a voz de Cristo Rei dizendo também a nós: “Em verdade te digo: Hoje estarás comigo no Paraíso”.

Obras consultadas:
DIAS, João S. Clá, O Inédito sobre os Evangelhos Vol VI, Libreria Editrice Vaticana, Città del Vaticano, 2012
ORIA, Mons. Angel Herrera, VERBUM VITAE – La Palavra de Cristo, Vol VIII, BAC, Madrid, 1954

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33º Domingo do Tempo Comum

Nos aproximamos do fim de mais um ano litúrgico. Em breve a Liturgia se revestirá de roxo para aguardar, na penitência, o nascimento do Redentor. Por esta razão, a Igreja deseja preparar as almas através da Palavra.

Na obra, “O inédito sobre os Evangelhos”, Mons. João Clá Dias – Presidente Geral dos Arautos do Evangelho – inicia seus comentários a respeito deste 33º Domingo do Tempo Comum relatando um fato ocorrido com São Pio X.

Conta-se que São Pio X, durante audiência aos membros de um dos colégios eclesiásticos romanos, perguntou aos jovens estudantes:
–– Quais são as notas distintivas da verdadeira Igreja de Cristo?
— São quatro, Santo Padre: Una, Santa, Católica e Apostólica
–– Não! há mais uma. Ela é também perseguida! Esse é o sinal de sermos verdadeiros discípulos de Jesus Cristo.

A Igreja é perseguida. De fato, sem essa nota não se entende bem a História da Esposa de Cristo, que já começa sob esse signo na mais tenra infância do seu Divino Fundador. Que mal poderia fazer a Herodes aquele Menino, filho de carpinteiro, nascido numa gruta e deitado numa manjedoura? Nenhum. Mas na ímpia tentativa de tirar-Lhe a vida, o tetrarca não hesitou em mandar assassinar crianças inocentes.
Ao longo da vida pública de Jesus, o ódio contra Ele não fez senão crescer, e chegou ao paroxismo quando os fariseus tomaram a decisão de matá-Lo e obtiveram de Pilatos a iníqua sentença de condenação.
Nessa mesma inimizade encontra-se a fonte das investidas sofridas pela Igreja após a subida de Nosso Senhor ao Céu.

Assim, foi movido por ódio furibundo contra os cristãos que Nero deu início, no ano 64, à sangrenta perseguição que haveria de durar, com intermitências, até 313, quando o Imperador Constantino concedeu liberdade à Igreja, pelo Edito de Milão. E ao longo dos séculos subsequentes, a Esposa de Cristo nunca deixou de enfrentar os mais variados ataques — por vezes cruentos — e incessantes oposições, ora abertas, ora solapadas.

Mesmo em nossos dias, este ódio contra aqueles que praticam o bem não deixa de se manifestar em seus múltiplos aspectos.

Naquele tempo, algumas pessoas comentavam a respeito do Templo que era enfeitado com belas pedras e com ofertas votivas.

Ponto de referência máximo do povo judeu, para o Templo se voltavam os corações dos israelitas do mundo inteiro. Entretanto, a julgar pelas palavras ditas a seguir por Nosso Senhor, tudo indica que estavam eles contemplando a casa de Deus com uma visualização meramente naturalista.

Jesus disse: “Vós admirais estas coisas? Dias virão em que não ficará pedra sobre pedra. Tudo será destruído”.

Os Apóstolos tinham diante de si Alguém que valia muito mais do que o Templo: o Criador, o Redentor, a Sabedoria eterna e encarnada. Ao contemplarem com olhos mundanos aquele prédio, manifestavam-se cegos para Deus, porque detinham-se na admiração da criatura sem se elevar até o Criador; compreendiam o símbolo, mas não o Simbolizado. Esta é a razão da contundente advertência de Nosso Senhor.

Mas eles perguntaram: “Mestre, quando acontecerá isto? E qual vai ser o sinal de que estas coisas estão para acontecer?”

Como observa São Cirilo, os Apóstolos “não perceberam a força de suas palavras e julgavam que Ele falava da consumação dos séculos”. Por isso, Nosso Senhor, “sem deixar de responder à pergunta com clareza suficiente para eles conjecturarem os acontecimentos vaticinados”, falará em dois sentidos: um, a destruição do Templo material; outro, o fim do mundo. Na realidade, o desaparecimento dessa grandiosa construção significava o fim de um mundo: a época da antiga Lei cedia lugar à era da graça.

Jesus respondeu: “Cuidado para não serdes enganados, porque muitos virão em meu nome, dizendo: ‘Sou eu!’; e ainda: ‘O tempo está próximo.’ Não sigais essa gente! Quando ouvirdes falar de guerras e revoluções, não fiqueis apavorados. É preciso que estas coisas aconteçam primeiro, mas não será logo o fim”. E Jesus continuou: “Um povo se levantará contra outro povo, um país atacará outro país. Haverá grandes terremotos, fomes e pestes em muitos lugares; acontecerão coisas pavorosas e grandes sinais serão vistos no céu”.

Ora, sempre que os pecados da humanidade passam de certo limite, Deus intervém manifestando sua cólera e castigando os caprichos e egoísmos dos homens.
Para contemplar a Deus na perspectiva verdadeira, sem distorções nem unilateralismos, é preciso amar n’Ele esses dois aspectos [a Justiça e a Misericórdia]. Considerar a Segunda Pessoa da Santíssima Trindade morrendo na Cruz para nos redimir, é poderoso estímulo para a nossa piedade. Mas não podemos também deixar de admirar sua severidade, ainda quando ela possa vir a nos atingir.
Porque, como ensina Santo Afonso Maria de Ligório, “não merece a misericórdia de Deus quem se serve dela para ofendê-Lo. A misericórdia é para quem teme a Deus, e não para o que dela se serve com o propósito de não temê-Lo. Aquele que ofende a justiça — diz o Abulense — pode recorrer à misericórdia; mas a quem pode recorrer o que ofende a própria misericórdia?”.

“Antes, porém, que estas coisas aconteçam, sereis presos e perseguidos; sereis entregues às sinagogas e postos na prisão; sereis levados diante de reis e governadores por causa do meu nome”.

Ao anunciar aos Apóstolos as perseguições e sofrimentos que haveriam de enfrentar, Nosso Senhor tinha em vista também instruir os cristãos de todos os tempos, porque inúmeras vezes ao longo da História a proclamação do nome de Jesus Cristo lhes trará como consequência serem injustamente presos, perseguidos ou conduzidos aos tribunais. E isto chegará ao auge nos últimos tempos, pois quanto maior for a decadência moral da humanidade, inelutavelmente mais ódio haverá contra os justos, cuja mera existência já representa muda censura aos maus.

“Esta será a ocasião em que testemunhareis a vossa fé”.

Nessas horas de tempestade, suscita a Providência testemunhas da Fé que sejam fachos da Luz de Cristo a rasgar a obscuridade da provação.
Quanto aos acontecimentos do fim do mundo, serão justamente a firmeza na fé e a força impetratória dos fiéis, perante o ódio insaciável dos sequazes do anticristo, que atrairão a intervenção divina, desencadeando o castigo final.

“Fazei o firme propósito de não planejar com antecedência a própria defesa; porque Eu vos darei palavras tão acertadas, que nenhum dos inimigos vos poderá resistir ou rebater”.

Com esta surpreendente afirmação, parece Nosso Senhor convidar seus discípulos à negligência, ao invés de incentivá-los a se prevenirem perante a perspectiva da perseguição. Mas nesta passagem do Evangelho refere-Se o Mestre aos momentos de extrema aflição em que tudo parece perdido. Nessas horas, comenta São Gregório, “é como se o Senhor dissesse a seus discípulos: ‘Não vos atemorizeis. Vós ireis ao combate, mas Eu é que combaterei; vós pronunciareis palavras, mas quem falará sou Eu’”.

“Sereis entregues até mesmo pelos próprios pais, irmãos, parentes e amigos. E eles matarão alguns de vós. Todos vos odiarão por causa do meu nome”.

Até no seio das próprias famílias haverá divisão, multiplicando o sofrimento daqueles que serão entregues por “pais, irmãos, parentes e amigos”. Pois, como ensina São Gregório, “os mais cruéis tormentos para nós são os causados pelas pessoas mais queridas, porque, além da dor corporal, sentimos o carinho perdido”.

“Mas vós não perdereis um só fio de cabelo da vossa cabeça”.

Cada um dos nossos atos, gestos ou atitudes serão consignados no livro da vida. Nenhum ato de virtude ficará sem recompensa, conforme afirma São Beda: “Não cairá um só fio de cabelo da cabeça dos discípulos do Senhor, porque não somente as grandes ações e as palavras dos santos, mas também o menor de seus pensamentos será dignamente premiado”.

“É permanecendo firmes que ireis ganhar a vida!”

 

Uma vez compenetrados de estarmos de passagem nesta Terra, a caminho da eternidade, todos os males que possamos sofrer tomam outra dimensão. “Quem sabe que é um peregrino neste mundo, independentemente do local onde se encontre corporalmente; quem sabe que tem uma pátria eterna no Céu; quem tem certeza de que ali se encontra a região da vida feliz, a qual aqui é lícito desejar, mas não é possível ter, e arde nesse desejo tão bom, santo e casto — esse vive aqui pacientemente”.
É permanecendo firmes na Fé que ganharemos a verdadeira vida; é só na perspectiva da glória eterna que teremos forças para perseverar na hora das provações. E isto não depende tanto do nosso esforço quanto da graça divina, que devemos pedir sem cessar.

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Obras consultadas:

DIAS, João S. Clá, O Inédito sobre os Evangelhos Vol VII, Libreria Editrice Vaticana, Città del Vaticano, 2012

 

 

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