33º Domingo do Tempo Comum

Nos aproximamos do fim de mais um ano litúrgico. Em breve a Liturgia se revestirá de roxo para aguardar, na penitência, o nascimento do Redentor. Por esta razão, a Igreja deseja preparar as almas através da Palavra.

Na obra, “O inédito sobre os Evangelhos”, Mons. João Clá Dias – Presidente Geral dos Arautos do Evangelho – inicia seus comentários a respeito deste 33º Domingo do Tempo Comum relatando um fato ocorrido com São Pio X.

Conta-se que São Pio X, durante audiência aos membros de um dos colégios eclesiásticos romanos, perguntou aos jovens estudantes:
–– Quais são as notas distintivas da verdadeira Igreja de Cristo?
— São quatro, Santo Padre: Una, Santa, Católica e Apostólica
–– Não! há mais uma. Ela é também perseguida! Esse é o sinal de sermos verdadeiros discípulos de Jesus Cristo.

A Igreja é perseguida. De fato, sem essa nota não se entende bem a História da Esposa de Cristo, que já começa sob esse signo na mais tenra infância do seu Divino Fundador. Que mal poderia fazer a Herodes aquele Menino, filho de carpinteiro, nascido numa gruta e deitado numa manjedoura? Nenhum. Mas na ímpia tentativa de tirar-Lhe a vida, o tetrarca não hesitou em mandar assassinar crianças inocentes.
Ao longo da vida pública de Jesus, o ódio contra Ele não fez senão crescer, e chegou ao paroxismo quando os fariseus tomaram a decisão de matá-Lo e obtiveram de Pilatos a iníqua sentença de condenação.
Nessa mesma inimizade encontra-se a fonte das investidas sofridas pela Igreja após a subida de Nosso Senhor ao Céu.

Assim, foi movido por ódio furibundo contra os cristãos que Nero deu início, no ano 64, à sangrenta perseguição que haveria de durar, com intermitências, até 313, quando o Imperador Constantino concedeu liberdade à Igreja, pelo Edito de Milão. E ao longo dos séculos subsequentes, a Esposa de Cristo nunca deixou de enfrentar os mais variados ataques — por vezes cruentos — e incessantes oposições, ora abertas, ora solapadas.

Mesmo em nossos dias, este ódio contra aqueles que praticam o bem não deixa de se manifestar em seus múltiplos aspectos.

Naquele tempo, algumas pessoas comentavam a respeito do Templo que era enfeitado com belas pedras e com ofertas votivas.

Ponto de referência máximo do povo judeu, para o Templo se voltavam os corações dos israelitas do mundo inteiro. Entretanto, a julgar pelas palavras ditas a seguir por Nosso Senhor, tudo indica que estavam eles contemplando a casa de Deus com uma visualização meramente naturalista.

Jesus disse: “Vós admirais estas coisas? Dias virão em que não ficará pedra sobre pedra. Tudo será destruído”.

Os Apóstolos tinham diante de si Alguém que valia muito mais do que o Templo: o Criador, o Redentor, a Sabedoria eterna e encarnada. Ao contemplarem com olhos mundanos aquele prédio, manifestavam-se cegos para Deus, porque detinham-se na admiração da criatura sem se elevar até o Criador; compreendiam o símbolo, mas não o Simbolizado. Esta é a razão da contundente advertência de Nosso Senhor.

Mas eles perguntaram: “Mestre, quando acontecerá isto? E qual vai ser o sinal de que estas coisas estão para acontecer?”

Como observa São Cirilo, os Apóstolos “não perceberam a força de suas palavras e julgavam que Ele falava da consumação dos séculos”. Por isso, Nosso Senhor, “sem deixar de responder à pergunta com clareza suficiente para eles conjecturarem os acontecimentos vaticinados”, falará em dois sentidos: um, a destruição do Templo material; outro, o fim do mundo. Na realidade, o desaparecimento dessa grandiosa construção significava o fim de um mundo: a época da antiga Lei cedia lugar à era da graça.

Jesus respondeu: “Cuidado para não serdes enganados, porque muitos virão em meu nome, dizendo: ‘Sou eu!’; e ainda: ‘O tempo está próximo.’ Não sigais essa gente! Quando ouvirdes falar de guerras e revoluções, não fiqueis apavorados. É preciso que estas coisas aconteçam primeiro, mas não será logo o fim”. E Jesus continuou: “Um povo se levantará contra outro povo, um país atacará outro país. Haverá grandes terremotos, fomes e pestes em muitos lugares; acontecerão coisas pavorosas e grandes sinais serão vistos no céu”.

Ora, sempre que os pecados da humanidade passam de certo limite, Deus intervém manifestando sua cólera e castigando os caprichos e egoísmos dos homens.
Para contemplar a Deus na perspectiva verdadeira, sem distorções nem unilateralismos, é preciso amar n’Ele esses dois aspectos [a Justiça e a Misericórdia]. Considerar a Segunda Pessoa da Santíssima Trindade morrendo na Cruz para nos redimir, é poderoso estímulo para a nossa piedade. Mas não podemos também deixar de admirar sua severidade, ainda quando ela possa vir a nos atingir.
Porque, como ensina Santo Afonso Maria de Ligório, “não merece a misericórdia de Deus quem se serve dela para ofendê-Lo. A misericórdia é para quem teme a Deus, e não para o que dela se serve com o propósito de não temê-Lo. Aquele que ofende a justiça — diz o Abulense — pode recorrer à misericórdia; mas a quem pode recorrer o que ofende a própria misericórdia?”.

“Antes, porém, que estas coisas aconteçam, sereis presos e perseguidos; sereis entregues às sinagogas e postos na prisão; sereis levados diante de reis e governadores por causa do meu nome”.

Ao anunciar aos Apóstolos as perseguições e sofrimentos que haveriam de enfrentar, Nosso Senhor tinha em vista também instruir os cristãos de todos os tempos, porque inúmeras vezes ao longo da História a proclamação do nome de Jesus Cristo lhes trará como consequência serem injustamente presos, perseguidos ou conduzidos aos tribunais. E isto chegará ao auge nos últimos tempos, pois quanto maior for a decadência moral da humanidade, inelutavelmente mais ódio haverá contra os justos, cuja mera existência já representa muda censura aos maus.

“Esta será a ocasião em que testemunhareis a vossa fé”.

Nessas horas de tempestade, suscita a Providência testemunhas da Fé que sejam fachos da Luz de Cristo a rasgar a obscuridade da provação.
Quanto aos acontecimentos do fim do mundo, serão justamente a firmeza na fé e a força impetratória dos fiéis, perante o ódio insaciável dos sequazes do anticristo, que atrairão a intervenção divina, desencadeando o castigo final.

“Fazei o firme propósito de não planejar com antecedência a própria defesa; porque Eu vos darei palavras tão acertadas, que nenhum dos inimigos vos poderá resistir ou rebater”.

Com esta surpreendente afirmação, parece Nosso Senhor convidar seus discípulos à negligência, ao invés de incentivá-los a se prevenirem perante a perspectiva da perseguição. Mas nesta passagem do Evangelho refere-Se o Mestre aos momentos de extrema aflição em que tudo parece perdido. Nessas horas, comenta São Gregório, “é como se o Senhor dissesse a seus discípulos: ‘Não vos atemorizeis. Vós ireis ao combate, mas Eu é que combaterei; vós pronunciareis palavras, mas quem falará sou Eu’”.

“Sereis entregues até mesmo pelos próprios pais, irmãos, parentes e amigos. E eles matarão alguns de vós. Todos vos odiarão por causa do meu nome”.

Até no seio das próprias famílias haverá divisão, multiplicando o sofrimento daqueles que serão entregues por “pais, irmãos, parentes e amigos”. Pois, como ensina São Gregório, “os mais cruéis tormentos para nós são os causados pelas pessoas mais queridas, porque, além da dor corporal, sentimos o carinho perdido”.

“Mas vós não perdereis um só fio de cabelo da vossa cabeça”.

Cada um dos nossos atos, gestos ou atitudes serão consignados no livro da vida. Nenhum ato de virtude ficará sem recompensa, conforme afirma São Beda: “Não cairá um só fio de cabelo da cabeça dos discípulos do Senhor, porque não somente as grandes ações e as palavras dos santos, mas também o menor de seus pensamentos será dignamente premiado”.

“É permanecendo firmes que ireis ganhar a vida!”

 

Uma vez compenetrados de estarmos de passagem nesta Terra, a caminho da eternidade, todos os males que possamos sofrer tomam outra dimensão. “Quem sabe que é um peregrino neste mundo, independentemente do local onde se encontre corporalmente; quem sabe que tem uma pátria eterna no Céu; quem tem certeza de que ali se encontra a região da vida feliz, a qual aqui é lícito desejar, mas não é possível ter, e arde nesse desejo tão bom, santo e casto — esse vive aqui pacientemente”.
É permanecendo firmes na Fé que ganharemos a verdadeira vida; é só na perspectiva da glória eterna que teremos forças para perseverar na hora das provações. E isto não depende tanto do nosso esforço quanto da graça divina, que devemos pedir sem cessar.

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Obras consultadas:

DIAS, João S. Clá, O Inédito sobre os Evangelhos Vol VII, Libreria Editrice Vaticana, Città del Vaticano, 2012