O Castigo do caluniador
Tinha a Rainha Santa Isabel, esposa do Rei Dom Dinis, um criado de confiança, muito bom e fiel, a quem costumava entregar as esmolas dos pobres.
Outro criado, invejoso e caluniador, levara a mal a confiança da Rainha.
Ferido de ciúmes, vai ter com o rei e começa com grandes fingimentos, sem acabar de dizer o que queria. Por meias palavras dava a entender que o caso era grave e aguçava assim a curiosidade do rei. Até que ele, irritado, gritou:
– Fala por uma vez, e fala já!
Foi então que o invejoso se saiu com uma mentira muito feia contra o próprio amigo. Nada mais, nada menos, que andava a conquistar o amor da rainha.
O rei acreditou. Furioso, saiu para o campo, a espairecer e, ao mesmo tempo, a preparar o castigo para o criminoso.
Passando por um forno, onde se queimava cal, teve uma idéia. Era ali que haveria de morrer o malvado. E diz ao forneiro:
— Amanhã, muito cedo há de vir aqui um homem a perguntar da minha parte: — Já está feito o que o rei mandou? Quando ele disser tais palavras agarrai-o e arremessai-o ao forno. É um criminoso que merece tal castigo.
No dia seguinte, pela manhã, chamou Dom Dinis o pajem, de confiança da rainha e disse-lhe que fosse ao forno de cal perguntar se já estava feito o que o rei tinha mandado.
Partiu logo o inocente rapaz. Ao passar por uma igreja, ouvindo tocar os sinos, entrou e ficou até ao fim da missa. Seguiram-se mais duas e ouviu-as também. Ansioso o rei por saber do sucedido, mandou, passada uma hora, o seu criado (o invejoso) perguntar ao forneiro se já estava cumprido o que na véspera lhe tinha mandado.
Partiu o caluniador, com grande pressa.
O caluniador – Já está feito o que o rei mandou? – Mal acabava de perguntar e os homens do forno o agarraram-no. Apesar dos seus protestos e gritos amarraram-no e lançaram ao forno, onde em breve ficou reduzido a cinzas. Pouco depois compareceu o criado inocente, perguntando:
—Já está feito o que o rei mandou?
—Sim, está tudo feito e acabado.
Correu o rapaz para o paço a dar a notícia. Ao vê-lo são e salvo assombrou-se Dom Dinis e não pôde conter-se sem bradar:
—Como é isto? Que fizeste?
—Senhor – confessou ingenuamente o pajem – eu ia cumprir a vossas ordens quando em uma igreja ouvi os sinos. Entrei e ouvi aquela missa e mais duas, porque o meu pai, à hora da morte me recomendou que ficasse até o fim das missas que ouvisse começar. Como sempre assim fiz, também hoje não quis faltar.
Assombrado ficou o rei, vendo aqui a justiça de Deus.
Abriram-se-lhe, de repente, os olhos da alma. Reconheceu a inocência da rainha, a virtude deste pajem e a maldade do outro.
Grande recompensa de quem tanto estimava a missa! E castigo tremendo para o criado caluniador.
Fonte: “O Clarin”, ano 55 – julho 2000 nº7
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